sexta-feira, 11 de março de 2011

Resenha: Fable III

Por Vitor "vD" Duarte




O que falar de um jogo excelente?

Quando se tem apenas qualidades para serem aclamadas, o que falar em uma resenha? Enaltecê-las do jeito mais fantástico possível? Tentar achar erros onde não existem? O que dizer quando, em um jogo, você tem uma experiência que ficará eternamente marcada na sua trajetória como gamer? Algo inigualável, que você nunca viu antes e talvez nunca esperava ver em qualquer título?

Meus amigos, eu escrevi essas palavras há tempos atrás. Trinta minutos depois de começar a jogar Fable III.



Falando um pouco de cronologia: Fable saiu em sua versão original para o PC e para a primeira forma do Xbox, sendo o primeiro trabalho da Lionhead Studios, sob o comando do “visionário” Peter Molyneux. Esse RPG de ação narrava as histórias de um herói genérico no mundo de Albion, e ele deveria escolher entre o caminho do bem e do mal de acordo com suas ações. A continuação não tardou, e Fable II atingiu o Xbox 360 excelentemente, num épico que se passa 500 anos depois do original, sobre a jornada de um novo herói e, novamente, suas escolhas determinam sua história.

É difícil comparar a série Fable com qualquer outro jogo que existe. Desde a primeira edição, dá pra notar um esmero muito grande na produção do mundo de Albion. A ação e o combate são singulares, dinâmicos e empolgantes, e a construção técnica do seu personagem reflete o caráter de escolhas que você tem durante a história, sempre havendo vários caminhos diferentes para sua especialização. O herói segue o destino que você preferir, assumindo o espírito de RPG que existe em títulos como Fallout ou Mass Effect. Mas a característica mais marcante é o senso de humor presente nas várias situações do jogo, principalmente em missões opcionais. O povo de Albion funciona como uma caricatura histórica, com referências aqui e ali não só à realidade como também aos jogos da série em si. São histórias paralelas que nos arrancam risadas boas durante o jogo.

Enfim, chega Fable III. E aqui eu digo o quão difícil é falar desse jogo. O porque você vai descobrir rapidinho.



O bom/O mau e o Rei

Albion evoluiu. Em cinquenta anos, sob o comando do Rei Herói, o mundo entrou numa revolução industrial profunda. Os prédios cresceram, as cidades se ergueram, o vapor toma conta das ruas. E junto com o crescimento vem todos os problemas de um reino que, internamente, está em ruína.

O Rei Logan, filho do grande Herói que salvou Albion no passado, governa com punho de ferro e sem a menor tolerância. A riqueza se concentra no castelo, e as cidades do reino têm necessidades básicas a serem cumpridas. Mendigos lotam as ruas, crianças são forçadas ao trabalho industrial, a esperança sumiu dos olhos dos cidadãos. A capital Bowerstone vive tempos negros, quando tudo que se tem para mostrar é uma cidade oprimida, sem vida.

Contra isso está você. O filho/filha mais novo/nova do Rei. E cabe à você tomar a atitude que o povo demanda da família real. Albion precisa de uma revolução. E não só disso. Precisa também de um herói novamente no trono.



Um reino, um jogo, uma revolução

A terceira edição da série Fable conta com inovações marcantes. Mas seu espírito continua preso no seu predecessor. Não é ruim, mas analisemos os seus efeitos.

As telas de pausa foram chutados para sempre. A interatividade com o cenário aqui está no ápice. Quando você precisa de mudar algo no seu personagem, ação que geralmente precisaria de um menu, você é transportado para um local chamado “Santuário”, onde você interage com as opções que você quer utilizar. A única vez que você escolhe itens em uma lista é quando você quer salvar o jogo ou ajustar tecnicalidades. De resto, todas as suas escolhas, no sentido mais geral da palavra, são feitas usando o herói como um cursor.

Os cenários são absurdamente bonitos. É tanto que chega a doer. Visualmente é uma melhora expressiva. A principal cidade do jogo anterior, Bowerstone, respira industrialização e é uma perfeita caricatura da Inglaterra do século dezoito. Pra quem a viu antes, notará que houve uma grande expansão em suas ruas, mas é possível reconhecer partes da cidade facilmente. Fable III tem gráficos impecáveis. E as cutscenes, excelente adição à imersão no jogo, são igualmente bonitas.



Algo que vale a pena destacar: Dessa vez, diferentemente de vários outros jogos onde você precisa fazer decisões marcantes, o herói fala. E não é aquele falar que estraga o jogo do mesmo jeito que Zelda iria para o vinagre se o Link falasse algo. A fala é complementar, somente o necessário pra não ficar estranho em cutscenes ou em cenas que ele precisa se expressar, mas não o faz de maneira marcante se não houver um apelo vocal.

Apesar de que, pensando um pouco, ele continua meio neutro mesmo com isso... Mas ok, eu aprecio o esforço, não me ofende.

O processo de crescimento em poder se transformou completamente. Seus pontos de experiência foram convertidos em Guild Seals, que você junta derrotando inimigos ou desenvolvendo relações com pessoas. Esses Seals são gastos em um espaço único, chamado “Road to Rule” que espelha seu crescimento como herói e também é uma metáfora para seu caminho até o trono. Lá você usa a experiência adquirida pra abrir baús que contém melhorias, como expressões novas, cores para suas roupas e aumento de força de suas armas. Abrir todos os baús não é um processo fácil.

E falando em armas, o combate apenas melhorou o antigo, com o herói encarando muito mais inimigos logo no início do jogo. Suas armas são mais limitadas: Ainda existe a opção de usar armas brancas e armas de fogo, mas só existem quatro tipos no total: espadas, martelos, pistolas e rifles. Basicamente: Ou você vota por um combate rápido ou por um golpe forte.

Os equipamentos também evoluem de maneira diferente: Quanto mais você as usa, mais forte elas ficam. Não só isso: O jeito como você as usa reflete na própria aparência da arma. Toda vez que você faz uma melhoria nela com Guild Seals, ela passa por uma transformação que é baseada nas atitudes que você tomou desde a última “compra”.

Trivia legal: Molyneux disse que muito da luta em Fable é inspirada pela icônica cena dos 88 malucos em Kill Bill. Aqui dá pra ver que isso realmente acontece. Tirando o sangue, claro.



Mas o maior destaque do combate vai para a magia. O sistema, novamente, é bastante parecido com o do jogo anterior, mas algumas diferenças são úteis de se ressaltar. Primeiramente, a variedade de técnicas mágicas diminuiu, simplificando o uso das mesmas. E agora é possível utilizar duas magias ao mesmo tempo, misturando seus efeitos. Se transformar no arquimago definitivo envolve experimentar todas as combinações disponíveis, e decidir qual será a que mais combina com você.

Pode parecer que não, mas em essência, tudo é simples em Fable III.

Seu envolvimento com os cidadãos de Albion é também uma parte interessante do jogo. É possível interagir com uma pessoa por vez, sendo gentil ou grosso. Ainda é possível se casar, ter filhos, fazer sexo grupal e contrair DSTs (!). E o relacionamento que você desenvolver também lhe dará experiência para gastar no Road to Rule. Sem contar que é tudo muito divertido. Porque é muito legal aparecer do nada, interagir com um estranho e tirá-lo pra dançar.

Por fim, toda a customização de Fable está presente aqui. Você pode mudar roupas, cabelos, bigodes - inclusive nas mulheres - tatuagens, maquiagem e combinar variados tipos de peças de vestuário. Pode escolher também entre ser um herói esguio ou um glutão eternamente com fome. Mais do que nunca, é tudo decidido por você.

E essa sensação de responsabilidade cresce a cada decisão que você toma. É aqui que digo que o jogo te coloca certas vezes em situações que uma escolha difícil é necessária, colocando todo o peso do mundo em seus ombros. Essas escolhas que lhe proporcionam momentos raramente vistos em outros títulos.



Albion ainda é Albion... Em todos os aspectos

A maior qualidade, e talvez também o maior defeito de Fable III é que ele tem raízes extremamente presas no segundo título da série. Inúmeras são as referências à Albion de 50 anos atrás. Quem teve a oportunidade de adorar o antecessor vai achar graça e ficar maravilhado com qualquer nome ou localidade que o jogo cite. Quem não o fez, no entanto, pode ficar perdido, e até entediado com tantas coisas que parecem ser sem sentido. Não é em tudo, no entanto. A maioria das cidades são novas, assim como os caminhos que você trilha. Ainda é possível se divertir bastante

A outra constante que é possível observar é a presença de bugs aqui e ali. Não é algo que arruine a experiência e a imersão no jogo, muito menos é comparável com o excesso de bugs que havia em Fable II. Mas tem alguns aspectos que realmente deixam a desejar nesse campo. Coloquemos desse jeito: as promessas de Molyneux foram violadas, mas foi por pouco.

De resto? Eu não consigo achar algo que eu não goste.



Veredicto

Fable III, assim como seu predecessor, é um jogo diferente do que estamos acostumados. Vemos elementos familiares aqui e ali, mas não são apresentados da mesma forma. É que nem humor britânico: Aqueles que não entendem ou que não estão acostumados não verão graça nem mesmo se fizerem força pra tanto. E, já que estamos no assunto, coitados daqueles que não gostam de Monty Python.

O fato é que esse é um daqueles jogos que, em algum ponto da minha vida, eu vou querer retirar de um baú de velharias, junto com meu Xbox 360 - que com a graça divina não vai ter dado 3RL até lá - e jogar novamente, para experimentar de novo a simplicidade sem compromisso que ganhou proporções imensuráveis.

Fundamentalmente, aqui temos uma carta de amor para aqueles que jogaram Fable II. E é por isso que pra mim é tão difícil falar dele. Eu poderia assumir uma posição mais técnica e considerar o jogo como um título isolado, mas pra mim não dá pra fazer isso. Ele é uma continuação em título, alma, essência e sentimento, que não só se aproveita de suas origens, como também as respeita imensamente.

Enfim, vocês querem um veredicto. Fable III é um jogo excelente? Bem... Não é perfeito como eu esperava que fosse depois de trinta minutos de jogo. Mas é um daqueles jogos cuja caixa pode ganhar um espaço de honra em sua estante, e seu disco gastar um tempo longo em seu console. Éééé... Méquichamames?

Ah, sim. Clássicos.


Fable III
Ação/RPG
Da Lionhead Studios, distribuído pela Microsoft
Xbox 360
História terminada uma vez com todas as sidequests feitas, menos aquelas que demandavam procura extensa de objetos pelo mundo. Jogado com uma heroína boazinha.